Em mais um capítulo da crescente tensão entre setores conservadores do Congresso e o Supremo Tribunal Federal, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) protocolou nesta quinta-feira (15) um pedido de impeachment contra o ministro Flávio Dino. A denúncia acusa o magistrado de crime de responsabilidade, por suposta atuação político-partidári, conduta vedada a integrantes da mais alta Corte do país.
O estopim da crise foi uma fala de Dino durante uma aula magna do curso de Direito do Centro Universitário UNDB, em São Luís (MA), na qual o ministro sugeriu, em tom descontraído, uma “chapa imbatível” para as eleições estaduais de 2026. Ele se referia ao atual vice-governador do Maranhão, Felipe Camarão (PT), pré-candidato ao governo estadual, e à professora Teresa Helena Barros, que também participou do evento. “Coloque a Teresa como vice-governadora, que essa chapa vai ficar imbatível, porque essa mulher é popular”, disse Dino diante de estudantes e professores.
Apesar da informalidade do comentário, Nikolas vê na fala uma grave quebra de conduta. Segundo ele, o ministro “transpôs os limites impostos aos magistrados” e utilizou sua posição institucional para interferir indevidamente no processo político do Maranhão. O pedido de impeachment foi protocolado no Senado, responsável por processar eventuais crimes de responsabilidade de ministros do STF.
“O indigitado agente público não apenas rompeu com o dever de neutralidade, como utilizou evento institucional, sua visibilidade pública e sua autoridade de ministro do Supremo Tribunal Federal para interferir diretamente na seara política do Maranhão”, afirma o documento apresentado por Nikolas.
Interlocutores próximos ao ministro classificaram as declarações como um “gracejo” feito em um ambiente informal, sem qualquer intenção de orientação política. O próprio Dino não comentou diretamente o caso até o momento, mas fontes próximas ressaltam que ele falava em tom descontraído com ex-colegas de profissão e alunos, em um contexto acadêmico, sem objetivo eleitoral.
No entanto, Nikolas argumenta que o histórico político de Flávio Dino exige um cuidado redobrado com a neutralidade. Antes de ser nomeado ao Supremo Tribunal Federal pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em dezembro de 2023, Dino teve longa trajetória partidária: foi governador do Maranhão por dois mandatos, ministro da Justiça e senador pelo PSB.
“O fato de ter migrado diretamente de um ministério para o STF, sem qualquer intervalo institucional, torna ainda mais delicada qualquer manifestação que possa ser interpretada como ingerência política”, argumenta o deputado.
A fala de Dino também gerou desconforto entre aliados do atual governador Carlos Brandão (PSB), rompido com Felipe Camarão e hoje um dos principais adversários políticos do vice no estado. Segundo Nikolas, o próprio Camarão teria mencionado em vídeo que Dino foi responsável pela eleição de “diversos vereadores em 2024”, o que, na visão do parlamentar, reforçaria a tese de envolvimento político do ministro mesmo após sua posse no STF, ocorrida em fevereiro de 2024.
Além do pedido de impeachment, o deputado afirmou que deve apresentar uma segunda representação contra Dino ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com base nos mesmos fundamentos.
A professora Teresa Helena Barros, citada por Dino na suposta “sugestão de chapa”, afirmou que não tem qualquer intenção de se candidatar e que a menção feita pelo ministro não reflete planos políticos reais.
De acordo com a Constituição Federal, ministros do STF devem se abster de qualquer manifestação que comprometa a imparcialidade exigida para o exercício do cargo. Atos de natureza político-partidária, se comprovados, podem configurar crime de responsabilidade passível de julgamento pelo Senado Federal. No entanto, raramente essas acusações avançam nas etapas formais do processo legislativo.
Agora, cabe à Presidência do Senado decidir se acatará o pedido de impeachment ou o arquivará sumariamente, como ocorreu com outras tentativas anteriores de afastamento de ministros da Corte.